domingo, 29 de janeiro de 2012

"Por uma sociedade à Esquerda", 13 anos depois (I Parte)

Sumário: Em 21 de Janeiro de 1999, enquanto militante do Partido Socialista, apresentei uma moção sectorial ao XI Congresso Nacional. Em conversa com amigos, veio à baila este escrito, que se encontra ainda disponível on line, e cuja oportunidade em 1999 está cabalmente demonstrada. Com efeito, muitos dos problemas abordados revelam uma grande actualidade, e merecem reflexão, atento o estado a que chegámos. De então até hoje, deixei o Partido Socialista e passei, a partir de 2010, a militar no Bloco de Esquerda. Politicamente terei mudado de opinião? Verificava-se então, ou agora, incoerência entre o meu pensamento e a minha militância partidária? Estas são questões que poderão ter uma multiplicidade de respostas, dependendo do prisma de quem faça a análise. Num momento em que o PS chegou a este ponto e o BE debate internamente, julguei oportuno republicar este texto, corrigindo algumas gralhas, e intercalando, 13 anos depois, algumas anotações e reflexões pessoais. Pela extensão sua extensão, este documento será dividido em várias partes. Nesta primeira parte, farei uma introdução e enquadramento, publicando a primeira parte da moção, em que abordo os mass media e a globalização e os seus efeitos na democracia e na economia.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Concertação Social ou a morte dos sindicatos, tal como os conhecemos

Sumário: Foi hoje assinado, com pompa e circunstância, o acordo de concertação social. Como já se havia verificado noutras épocas, a CGTP retirou-se da mesa negocial e a UGT negociou e consentiu num mau acordo para os trabalhadores. Associações Patronais e Governo congratularam-se com o acordo alcançado e afirmaram, de forma magnânima, que não há vencedores nem vencidos. Mas na verdade houve vencedores, na mesma medida em que houve vencidos. Vencedor, o Governo, que desta forma assume medidas drásticas para o saneamento financeiro do país, mais uma vez à custa da mole de trabalhadores que constituem a classe média. Vitoriosas as associações patronais, que ganham com a precariedade e a desregulação do mercado de trabalho e com o aumento do tempo de trabalho. Com este acordo, reduz-se o subsídio de desemprego (previamente pago pelos trabalhadores com as suas contribuições para a Segurança Social), aumentam-se tempos de trabalho e reduzem-se compensações por cessação de contrato de trabalho. Vencidos, os milhões de portugueses que são trabalhadores por conta de outrem, pelos motivos óbvios, e ainda por permanecerem impávidos e serenos, face à inevitabilidade que lhes foi vendida. E os movimentos sindicais? Esses não estão vencidos, estão mortos há muito, pelo menos na forma que os conhecemos, só que ainda ninguém lhes disse. Há que mudar este estado de coisas!

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

A transcendência constitucional da Autonomia Local e a reforma territorial

Sumário: A autonomia local é uma realidade pré-existente à Constituição, e não uma decorrência dela. Quer quanto à existência institucional das autarquias locais, quer, muitas vezes, quanto à existência em concreto de cada uma delas. Falamos de uma realidade que se perde com o início da sedentarização do Homem, em geral, e no caso concreto português, de realidades com centenas de anos de história, em alguns casos anteriores até à formação da nacionalidade. Estes factos dotam a autonomia local, quer se fale dela em termos gerais, enquanto instituição do Direito, quer em termos concretos, no que tange à existência de cada autarquia local individualmente considerada, de uma legitimidade autónoma e na maioria dos casos anterior e transcendente à própria legitimidade que funda a Constituição. A reforma que se pretende fazer tem, por isso, necessariamente de ser feita com a participação das populações. De resto, é uma imposição da Carta Europeia da Autonomia Local, que aliás prescreve o recurso ao referendo, no seu artigo 5.º. A via do referendo como legitimação da reforma do mapa das autarquias locais deve ser, por tudo isto, a via escolhida para qualquer reforma que se venha a fazer.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

O panfleto do Pingo Doce

Sumário: Já me havia referido ao episódio Jerónimo Martins. O boicote ao Pingo Doce pareceu-me despropositado. Afinal, economicamente não sou um liberal, e era o que mais me faltava colaborar com a tese de que o mercado poderia resolver a suas próprias falhas! Sempre pensei, e penso, que tal boicote deve ser feito aos políticos e partidos que, por acção ou omissão, permitem situações como as geradas pelos donos do Pingo Doce. Apesar de me manter um fiel cliente do Pingo Doce, tal não foi suficiente para demover o Senhor Pedro Soares dos Santos de me tentar fazer passar por parvo!

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Iniciativa Legislativa de Cidadãos: quem tem medo da democracia participativa?

Sumário: A possibilidade de cidadãos eleitores apresentarem iniciativas legislativas à Assembleia da República foi aberta com a Revisão Constitucional de 1997. Só em 2003 viria a ser regulamentada por lei, cujos requisitos para apresentação de iniciativas legislativas por cidadãos são tão exigentes que, em mais de 8 anos de vigência, apenas foi apresentada uma iniciativa legislativa de cidadãos! Por outro lado, a iniciativa legislativa de cidadãos é limitada a várias matérias, algumas por razões constitucionais, outras por razões inexplicáveis, como é o caso do estatuto de titulares de cargos políticos. Trata-se, no fundo de esvaziar materialmente este instituto de Democracia Participativa. No presente artigo procura-se falar criticamente do regime jurídico da Iniciativa Legislativa de Cidadãos e fazer a crítica à actuação dos partidos políticos portugueses nesta matéria. Sugerem-se ainda algumas alterações ao actual regime para que a iniciativa legislativa cidadã seja um efectivo instrumento de Democracia Participativa.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

A Maçonaria: resposta às inquietações de Daniel Oliveira

Sumário: Daniel Oliveira publicou "Maçonaria: a loja de coveniência da democracia". Tal texto, pela gravidade de algumas considerações sobre a Maçonaria e uma posição de ataque a Direitos Fundamentais nele sugerida, não pode passar sem uma resposta clara. Em muitos aspectos é um texto cujo teor e conclusões põem em causa não só a honorabilidade da Maçonaria, como os mais basilares Princípios do Estado de Direito Democrático.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

A Maçonaria: resposta a algumas inquietações

Sumário: A Maçonaria está na ordem do dia, pelos piores motivos. As notícias recentemente publicadas provocaram uma panópila de reacções negativas em conversas de café e redes sociais. Impõe-se, por isso, responder com clareza às inquietações que daí advêm, inquietações a que não é alheia a  justa insatisfação de um Povo com a sua situação económica, social e política. Mas quando a esta justa insatisfação se soma a intolerância e o preconceito, o erro vem a caminho. E, nunca é de mais dizê-lo, a história já nos ensinou nos anos vinte e trinta do século XX, até onde nos pode conduzir a ignorância, o preconceito e o erro!

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

A “Janeirinha”, uma grosa de anos depois, os mesmos problemas!

Sumário: Portugal, 4 de Janeiro - reforma do mapa das freguesias e concelhos, aumento dos impostos sobre o consumo e reestruturação do Ministério da fazenda. Não, não se trata de 4 de Janeiro de 2012, mas sim de 4 de Janeiro de 1868. Na sequência deste conjunto de reformas, que geraram grande descontentamento popular, eclodiu no Porto, a 1 de Janeiro de 1868, uma grande revolta popular que viria a conduzir à queda do Governo, a 4 de Janeiro de 1868.

As profundas raízes do poder local e do receituário para a resolução das crises económicas e financeiras do país aconselham, nesta data, a visita a estes acontecimentos do passado, procurando aprender com os erros de então.

Perceber, no fundo, que os Portugueses nem sempre estiveram letárgicos nas dificuldades e da importância da sua participação em reformas como a do mapa administrativo.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Alexandre Soares dos Santos, de Grilo Falante a Frei Tomás: crise, União Europeia, livre circulação de capitais e competitividade fiscal

Sumário: A União Europeia instituiu a liberdade de circulação de pessoas, bens e capitais, bem como a liberdade de estabelecimento. Como isntrumento para a concretização destes objectivos, instituiu o Euro, que independentemente do seu desempenho, visava evitar a concorrência desleal entre Estados, através de práticas de desvalorização competitiva da moeda. Medidas tendentes à harmonização fiscal que evitassem a circulação de capital parasitário, que sem desenvolver qualquer actividade relevante num país, lá colocam as suas participações sociais, para apenas beneficiarem de um regime fiscal mais favorável nunca foram tomadas.

Assim se permitiu a decisão da accionista principal da Jerónimo Martins, em transferir a sua posição no capital social desta para a Holanda. Todos ficámos chocados, mas esta não era a primeira operação do género, por empresas portuguesas. Pela nossa inércia, fomos também cumplices.

Igualmente desagradável, é a posição assumida pelo Sr. Alexandre Soares dos Santos, que viveu, até ao momento, apregoando nacionalismo, e cuja máscara cai com esta operação.

Mensagem de 2012: Vim para vos incomodar, não vim para vos conformar

I - Chegados que estamos ao cabo deste ano de 2011, reproduzem-se saudações de boas vindas ao novo ano e repetem-se, indiferenciadamente, votos de um bom e feliz 2012. Votos que são efectuados ora por contacto pessoal, ora de forma menos directa, afectuosa e pessoal por via de correio electrónico, cartões ou sms’s. Contactos que são efectuados ora de forma sincera, ora como convenção social.

Este ano optei por não desejar bom ano novo a ninguém. Esta opção nada tem que ver com um amuo, um estado de espírito depressivo ou ainda com um comportamento egoísta de guardar esses votos para mim e para os meus, recusando-me a partilha-los com todos os que lidam comigo. Tem que ver, sobretudo, com uma recusa convicta de alinhar no branqueamento de um período que será tudo menos bom.

Este ano resisti a deixar amolecer o meu estado de espírito pela quadra de paz e amor que, alegadamente, encerra o espírito do Natal e demais comemorações solisticais.

É bem verdade que esta quadra é caracterizada por um aparente de espírito de fraternidade e amor universal, com grande destaque para a valorização do convívio familiar e, sobretudo do consumo desenfreado, num estado de alienação de espírito que dulcifica a nossa maneira de ver o mundo.
Mas também é verdade que esta dimensão nada tem de fraterna quando provoca desconforto em todos aqueles que, por não terem família e amigos, por não terem recursos económicos para terem os níveis de consumo que nos são incutidos pela publicidade e toda a metralha disparada pelos meios de comunicação social e ainda pelo sem número de oradores de ocasião, que investidos no seu orgulho familiar ou com a sua situação económica arrasam os infortunados.
Estes factores, acompanhados pela grave situação do País e da Humanidade, levam-me, assim, a trocar a tradicional mensagem desejando um bom ano novo, por um grito de alerta e uma séria reflexão sobre o momento que vivemos. Sim, resisti à hipnose e alienação colectiva que me costuma atacar nesta época do ano.
II – Portugal é hoje um país conformado. Um país cujo Povo deixou de lutar, mas sobretudo de acreditar de uma forma geral nos seus dirigentes, nas políticas por estes desenvolvidas e, finalmente em si mesmo enquanto Povo.
Fomos fustigados, de forma subliminar, por termos adquirido casa própria, carro, por nos termos endividado, por termos aumentado o nosso nível de vida, e, consequentemente, condenados a pagar toda essa factura de termos aspirado a um melhor nível de vida.

Por isso, todos aqueles que nos incutiram confiança para levar a cabo essa melhoria, como sejam determinada classe política, a União Europeia, as grandes empresas, os bancos, a comunicação social, entre outros, apontam-nos agora o dedo e, com paternalismo reprovador exigem sacrifícios.

Ora, não foram eles que nos apontaram esse caminho? E já agora, que beneficiaram, de forma inequívoca dessa nossa conduta, ampliando o mercado, aumentando os respectivos lucros e resultados e oferecendo-nos uma panóplia de produtos que nos distraíram da realidade?

Uma pergunta se impõe: tendo sido a União Europeia, as grandes empresas e os bancos os beneficiários desta nossa conduta, que agora reprovam, quais os sacrifícios que lhes serão exigidos, e em que medida?

É essa a pergunta a que não querem, nem podem responder, sob pena de acordarem as nossas consciências. Preferem, de forma grave e paternalista, indicar-nos o caminho do sacrifício, que é redobrado por agora nos ser tirado muito daquilo que, afinal de forma leviana, eles próprios nos proporcionaram.

Parámos para pensar e, numa histeria colectiva, chegámos à conclusão que exagerámos no consumo, que fomos além das nossas possibilidades. E com isso nos conformamos, auto-flagelando-nos com a aceitação mais ou menos generalizada das medidas iníquas e desequilibradas que nos impõem.

Preferimos hoje, exorcizar a situação actual, atacando desenfreadamente os outros, nos seus direitos e dignidade, esquecendo que esses mesmos direitos e dignidade são nossos. Sem dar-mos por isso, desatámos a projectar as nossas frustrações no exercício dos direitos dos outros, esquecendo que também nós somos titulares desses mesmos direitos.

Refiro-me, claro está, aos cortes na Função Pública, à custa das regalias e direitos laborais, em nome do combate a um Estado alegadamente gordo e ineficaz, do qual somos também parte integrante e beneficiária.

Refiro-me ao corte de prestações sociais de que podemos beneficiar, em nome do combate ao abuso ou à fraude.

Refiro-me ao aumento do custo de serviços assegurados pelo Estado, como os cuidados de saúde, os transportes públicos ou a circulação rodoviária, em nome da poupança, do combate ou abuso, ou tão só do princípio do utilizador pagador, esquecendo sempre a solidariedade para com os mais desfavorecidos ou para com as regiões menos desenvolvidas.

Refiro-me ao acentuar da instabilidade e precariedade laboral, em nome da saúde da economia, penalizando trabalhadores, especialmente os mais velhos e os mais jovens, cuja remuneração será, por esta via, ainda mais condicionada.

E todos, mas todos eles, resultam de Direitos Fundamentais inscritos na Constituição, cujo cumprimento é um dever do Estado, e cujo dever fundamental associado aparece sobre a forma de impostos. Paradoxalmente, a par da redução de direitos, os deveres aumentam de forma insustentável.

Por tudo isto, 2012 será um ano de sacrifícios, de insatisfação e frustração da generalidade dos portugueses. Espero enganar-me, mas esta frustração conduzirá, inevitavelmente, à intolerância. Mas não à intolerância contra os verdadeiros responsáveis do estado a que chegámos, ou pelos responsáveis pela injusta repartição dos sacrifícios que nos são impostos.

Na verdade, a intolerância virá dos portugueses contra os portugueses. Haverá muitos que prontamente apontarão prontamente o dedo aos que, insatisfeitos, exprimam o seu desagrado: “Greve? O país precisa é de trabalho!”; “Manifestação? Que trabalhem, e não incomodem quem trabalha!”; “Opinião diversa? O que importa é unir, porque o futuro é incerto, e temos de dar um sinal ao exterior!”. E seguramente que haverá quem até ache que alguns dos Direitos Fundamentais que suportam estas condutas, são afinal modeláveis, alienáveis e até mesmo descaracterizáveis, em nome de uma paz social que nos permita sair ordeiramente, pelo caminho que nos impuseram, desta situação.

É este, fundamentalmente, o meu receio em relação ao ano que se inicia: que seja um ano de destruição do essencial que levou séculos, de sangue, suor e lágrimas a construir: um sistema de Direitos Humanos, de Garantias e Direitos de Participação Política e de Direitos Económicos Sociais e Culturais.

E tudo, mas tudo, em nome de uma Paz Social que não pode existir, na medida da distribuição dos sacrifícios imposta aos portugueses. Tudo, mas tudo, por causa da letargia de um Povo que desistiu de lutar, e se conformou, em pânico, com o que lhe foi imposto.

Estamos em risco de perder muito, do nosso conforto e da satisfação das nossas necessidades, até das mais básicas, e se assim continuarmos, perderemos muito mais, perderemos a nossa dignidade, cuja expressão mais não é que o acervo de Direitos Fundamentais.

E tudo, mas tudo, porque qual avestruz enterrámos a cabeça na areia, e nos recusamos a ver a verdadeira causa das coisas, assumindo cada um de nós a responsabilidade como nossa, ou como de outros, particularizada em casos concretos e pontuais de injustiça e abuso. Em suma, virando-nos uns contra os outros, e a final, contra nós próprios!

III – A imposição de todas estas medidas de austeridade, decorre dos compromissos firmados com a União Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional, verificando-se especial pressão de países como a Alemanha e a França, curiosamente as maiores economias da zona euro.

O euro nasceu como forma de assegurar estabilidade cambial e evitar os perigos da prática da desvalorização competitiva de moedas num espaço de livre circulação de mercadorias e bens. Sem dúvida que se tratou de uma medida essencial e louvável, permitindo, em princípio, maior justiça nas transacções entre as economias integrantes da União Europeia.  Sucede que, os critérios que fundam o Euro foram desadequados e desequilibrados para muitas das economias da zona Euro.

Optou-se por uma moeda forte, constantemente valorizada face a outras divisas, e óptima para quem importa matérias-primas e exporta produtos de alto valor acrescentado. Resulta claro quem beneficiou, e beneficia desta situação: os países mais desenvolvidos e cujo valor acrescentado da respectiva produção beneficiam com uma moeda forte. As consequências são evidentes para países com uma estrutura menos desenvolvida, mais dependente dos custos da mão-de-obra e das flutuações cambiais. Curiosamente, os mesmos que pagarão, mais uma vez, a factura do resultado dessas políticas!

Importante, não é a saída do Euro, ou a divisão da Europa em vários “pelotões”, como alguns advogam. Importante é o reforço da solidariedade europeia, e a adopção de novos critérios de convergência da Zona Euro, que se traduzam numa maior equidade na ponderação dos interesses das diversas economias que a compõem!

O Banco Central Europeu, cujas reservas resultam da contribuição dos Bancos Centrais dos Estados Membros não pode emprestar a esses Estados. Contudo, alimenta a especulação e a usura, ao emprestar a taxas reduzidas (1 %) aos bancos comerciais, o valores que estes emprestam a 5%, 6% e mais aos Estados, cujas reservas dos respectivos Bancos Centrais, sua propriedade, alimentam esse mesmo crédito concedido aos bancos comerciais.

Impõe-se por fim a este logro, a esta verdadeira imoralidade, cuja consequência é o seu pagamento pelos contribuintes dos países vítimas deste esquema.

Por isso, deve haver uma urgente renegociação da dívida, cujos encargos originaram todos estes sacrifícios pelo Povo Português e Europeu. Pela justiça, pela solidariedade entre os povos!

E para aqueles, que do alto da sua moralidade, alimentam este esquema, acrescentando com tom piedoso que os contratos e as obrigações são para cumprir, tenho uma mensagem: o nosso Código Civil, apesar da autonomia privada garantida às partes na celebração de contratos, prevendo situações de abuso, injustiça e exploração da necessidade alheia, impõe a todos os negócios privados esse respeito, sob pena de anulabilidade.

Se assim é relativamente aos contratos entre privados, na nossa vida quotidiana, não vejo razão para que não seja nos contratos que envolvam o Estado. Por isso, e não esquecendo a minha costela de jurista, transcrevo-vos três dessas normas:

“ARTIGO 282º
(Negócios usurários)
1. É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando alguém, explorando a situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios excessivos ou injustificados.
2. Fica ressalvado o regime especial estabelecido nos artigos 559º-A e 1146º.

ARTIGO 559º-A
(Juros usurários)

É aplicável o disposto no artigo 1146º a toda a estipulação de juros ou quaisquer outras vantagens em negócios ou actos de concessão, outorga, renovação, desconto ou prorrogação do prazo de pagamento de um crédito e em outros análogos.

ARTIGO 1146º
(Usura)

1. É havido como usurário o contrato de mútuo em que sejam estipulados juros anuais que excedam os juros legais, acrescidos de 3% ou 5%, conforme exista ou não garantia real.
2. É havida também como usurária a cláusula penal que fixar como indemnização devida pela falta de restituição de empréstimo, relativamente ao tempo de mora, mais do que o correspondente a 7% ou a 9% acima dos juros legais, conforme exista ou não garantia real.
3. Se a taxa de juros estipulada ou o montante da indemnização exceder o máximo fixado nos números precedentes, considera-se reduzido a esses máximos, ainda que seja outra a vontade dos contraentes.
4. O respeito dos limites máximos referidos neste artigo não obsta à aplicabilidade dos artigos 282º a 284º.”

IV – Perante tudo isto, não posso, como perceberão, alinhar na hipocrisia de desejar um bom ano de 2012, quando se torna evidente que ele não se perspectiva bom, nem justo.

Poderia ter ficado calado, no meu cantinho, e não vos incomodar. Mas não o podia fazer. Iria contra as minhas convicções e, acima de tudo, seria um desrespeito pela luta de todos que nos antecederam no labor de construir um mundo mais justo, um mundo de LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE, cujo aprimoramento quero continuar.

Para isso, apelo à consciência cívica, ao sentimento de justiça e à fraternidade de cada um de vós. Encolher os ombros não é o caminho! É tempo de interrogar, é tempo de incomodar!

Ventosa, 31 de Dezembro de 2011

Um abraço fraterno,

Rui Costa

Moralidade e Marmeleiro

Esta era a divisa inscrita na caricatura do Bispo D. António Alves Martins, de Bordalo Pinheiro. D. António Alves Martins, nascido em 18 de Fevereiro de 1808 em Alijó e falecido em Viseu a 5 de Fevereiro de 1882, foi Bispo de Viseu, líder político, Ministro do Reino e Par do Reino, sendo conhecida a sua filiação na Maçonaria. Liberal convicto e personagem polémico, foi uma figura marcante, pautada pela grande frontalidade e acutilância no debate, fosse ele político ou religioso.

Fazem falta homens desta dimensão, em momentos de grande tibieza das lideranças e das políticas dominantes.

Por isso, pedindo emprestado o título à gravura de Bordallo Pinheiro, e isnpirando-nos na falta de temor pelo debate que caracterizou D. António Alves Martins, tentaremos aqui, de forma descomprometida analisar a nossa sociedade.